Educar para transformar
Pensar o “entre-Nós”: O valor da convivência ética na Escola
“A ética: comportamento em que outrem, que lhe é estranho e indiferente, que não pertence nem à ordem de […]
27/08/2024 | POR Colégio Santo Agostinho
Colaborou com este post:
Marco Henrique Silva
Diretor Institucional de Ação Social e Pastoralidade
“A ética: comportamento em que outrem, que lhe é estranho e indiferente, que não pertence nem à ordem de seus interesses nem àquela de suas afeições, no entanto, lhe diz respeito. Sua alteridade lhe concerne.”
Emmanuel Lévinas
Não faltam motivos para que a Convivência Escolar esteja atualmente no centro de muitas reflexões. Afinal, a Escola é um espaço privilegiado de experiências e aprendizagens, em que a convivência, com suas alegrias e dores, encontros e desencontros, perpassa todo o processo de desenvolvimento de um estudante. Ela é dinâmica, fluida, viva e envolve todos os atores do ambiente escolar e, por isso, necessita ser compreendida e edificada continuamente – “entre-Nós”.
Considerando a complexidade deste tempo, sobretudo o pós-pandemia, não são poucos os relatos de pais, mães, professores e gestores escolares preocupados com o aumento de situações conflituosas próprias da convivência entre os estudantes na escola. Esses casos não são isolados e se escalam mundialmente em instituições de ensino. Conflitos, exclusões, violências, discriminações, bullying, cyberbullying, dentre outros. As inúmeras situações vivenciadas pelas escolas, fenômenos também de nossa sociedade contemporânea, indicam que os processos educativos atuais precisam promover novos saberes, para além daqueles que foram incutidos tradicionalmente na escola ao longo dos anos.
(Com)Viver “entre-Nós” é uma dimensão essencial da vida humana. Não é inata, ao contrário, ensina-se e aprende-se ininterruptamente. Perpassa inicialmente a Família e a Escola, ambas instituições educadoras. Na família, lar primário de socialização, as relações são tecidas no âmbito particular, os valores são individuais, restritos ao próprio grupo familiar, e a educação vai se constituindo com elementos próprios de sua cultura e comunidade. Porém, é na Escola que a dimensão da convivência se amplia de forma significativa. A diversidade de pessoas, identidades, culturas e valores ali presentes se manifestam naturalmente e indiscutivelmente – o não familiar se impõe! Por isso, as relações na Escola são compreendidas e constituídas no âmbito coletivo, ou seja, considerando todos os atores envolvidos. E é por esse motivo que necessitam estar entrelaçadas em princípios como o respeito às diferenças, o diálogo, o desenvolvimento da compreensão mútua e o reconhecimento das interdependências entre as pessoas que ali coexistem. Esses princípios para uma alteridade, norteadores para o fortalecimento de uma convivência ética na Escola, não estão apartados da vida em sociedade e, por isso, são saberes que toda a humanidade precisa se orientar com vistas a pensar e construir um futuro juntos.
Pensar “entre-Nós” não faz referência apenas a um grupo de pessoas que vivem juntos e se relacionam na Escola, mas, sim, no entendimento que as relações interpessoais são tecidas na complexidade deste tempo presente. Também são “nós” literalmente. Compreender essa dinâmica implica, essencialmente, na união de esforços com todos os envolvidos (família, escola, estudantes) para a construção de uma rede de relações interpessoais respeitosas e cooperativas. Um labor artesanal que possa favorecer o pertencimento, a pavimentação da cultura da paz, o diálogo, a fraternidade e o desenvolvimento de toda uma comunidade. Afinal, “pertencer a um povo é fazer parte de uma identidade comum, formada por vínculos sociais e culturais. E isso não é algo automático; muito pelo contrário: é um processo lento e difícil, rumo a um projeto comum.” (Papa Francisco, Fratelli Tutti 158).
Nesse sentido, um currículo escolar que considera o desenvolvimento da dimensão da convivência na vida do estudante, para além do aspecto da formação socioemocional, reconhece os desafios atuais e os futuros pelos quais ele será demandado a atravessar. Desta forma, a Escola é convocada a não só favorecer o desenvolvimento acadêmico, mas, eticamente, ser ambiente facilitador na construção de inúmeros projetos comuns possíveis, isto é, “entre nós”. Sendo assim, a convivência ética torna-se a trama fundamental para a constituição de um sujeito responsável e maduro, que possa reconhecer a realidade com espírito humano, crítico e criativo para reinventá-la continuamente.